O avô materno de Ana Maria Paiva Mourão, António Joaquim Fraústo, foi vítima de ataque de gás durante Grande Guerra. Preparado para a guerra, o Alferes Fraústo, que pertencia a uma bateria de artilharia, mostrava-se numa foto enviada para casa com a farda completa e o saco com a máscara de gás ao peito. A mesma máscara que deveria protege-lo do maldito flagelo que seriam os gases de guerra, que asfixiavam, queimavam e por vezes matavam um combatente em poucos segundos.
Jaime Cortesão, também ele uma futura vítima dos gases de guerra, que o deixariam cego por algum tempo e em perigo de vida, mencionaria no seu livro Memórias da Grande Guerra 1914 – 1918 o ataque que António sofreria no Front.Escreveu o médico, político e historiador português:
«Agora à tarde as cápsulas das granadas começaram a tanger lugubremente a gás alarme. Daí a pouco não se via senão gente sufocando, tossindo, com o nariz e a guela queimada e os olhos irritados lagrimejando. - Ponham as máscaras! Ponham as máscaras – grita-se.E breve vê-se rodar a multidão dos fantasmas mascarados com os grandes óculos pávidos e a tromba horrível e anelada, caindo do fole que tapa a cara. O Fraústo, um dos alferes artilheiros, vem em braços da bateria, tossindo, chorando, vomitando, rouco, aflito, Indignado, os olhos a saltar e uma baba espumosa, orlando-lhe a boca. - Morro! Sufoco! Malandros! Salve-me doutor! Acuda-me! Temos que o levar em braços para o posto. Prestam-se-lhe os primeiros socorros. Quero depois que ele ponha a máscara, mas ele não pôde, não quer. Continua a sufocar, a chorar, a babar-se, ansiando horrorosamente. Tiro a máscara e falo-lhe, encosto-o a mim, animo-o e convenço-o. Saímos agora. Parece que o vendaval dos gases amainou. Destapam-se as caras. Mas chegam sempre mais e mais homens que vomitam e choram e ansiam interminavelmente. » (Jaime Cortesão, Memórias da Grande Guerra 1914 – 1918), Porto: Renascença Portuguesa, 1919, p. 171).
Jaime Cortesão foi bem explícito. Não só Fraústo, o avô de Ana, foi gaseado durante a sua estadia nas trincheiras da Frente Ocidental. Toda uma geração de combatentes portugueses em França sofreria os efeitos dos gases, chegando a adoecer e, por vezes, nunca mais recuperando a saúde com que haviam partido para a guerra.
Era a guerra. Enquanto quintanista de Direito na Universidade de Coimbra, António terá sido mobilizado, embarcando para França a 19 de Janeiro de 1917 enquanto aspirante a oficial miliciano de Artilharia. Foi assim colocado no 5º Grupo de Batarias de Artilharia, pertença do Regimento de 1. Fez o curso de gás e foi promovido a alferes miliciano já em França.
Com o ataque de gás já mencionado, terá chegado a ser dado como desaparecido. Foi-lhe concedida licença para tratamento e, posteriormente a 9 de Abril de 1918, devido à reestruturação dos batalhões, foi integrado no 4º Grupo de Baterias de Artilharia, bem como incorporado num grupo britânico.
Regressaria a Lisboa em 8 de Fevereiro de 1919. Pouco depois tomaria parte das operações a Norte, efectuadas contra os revoltosos monárquicos que instauraram a denominada Monarquia do Norte. Em Abril de 1919 pede licença ilimitada para poder concluir o curso, o que não viria a concretizar-se.
Casou em Montalvão no dia 30 de Maio de 1921 com Amália Joaquina Pinto de Faria Pestana, nascida em 1902, e tiveram 5 filhos. Entre os seus herdeiros, conservam-se a máscara antigás, na sua bolsa identificada, fotografias tiradas em França, com dedicatórias, dois pequenos lenços bordados com as bandeiras dos países aliados, trazidos de França e oferecido à sua noiva, Amália, com quem casaria, e o seu copo, de metal.
Não falava muitas vezes da sua participação na guerra, mas quando a comentava, percebia-se que não apreciava grandemente os ingleses, embora lhes reconhecesse valor. Contava que sendo oficial, frequentava uma espécie de bar ou cantina onde era bem acolhido pelos oficiais ingleses, até porque falava a língua, excepto quando ia acompanhado de um português que fora seu colega na faculdade de Coimbra, e era mestiço.
Contava também que, estando uma vez de vigia numa estrutura elevada, desceu por uns instantes para recolher uma cerveja que um camarada lhe levara; nesse preciso momento, a torrezinha foi atingida por um morteiro. Salvou-se, pois, por um triz.
Todos os anos se reunia com outros homens da sua aldeia natal que tinham também combatido em França. Quando conseguia arranjá-la, partilhavam uma lata de corned beef, que lhes dava grande prazer, embora, no geral, dissessem que a comida não prestava. Ana Morão conheceu alguns destes homens. Um deles, conhecido por “Ti Alfredo”, tinha sido corneteiro e, com a voz, fazia os “toques” de corneta. Ti Alfredo afirmava ter sido o corneteiro que desfilou com o contingente português por baixo do Arco do Triunfo, em Paris, no dia da Vitória.
Quanto a António Joaquim Fraústo, viveu ainda para ver o seu filho mais novo, António partir para Moçambique, durante a guerra colonial. Infelizmente, não viria a assistir ao seu regresso, pois faleceu a 6 de Dezembro de 1972.
Jaime Cortesão, também ele uma futura vítima dos gases de guerra, que o deixariam cego por algum tempo e em perigo de vida, mencionaria no seu livro Memórias da Grande Guerra 1914 – 1918 o ataque que António sofreria no Front.Escreveu o médico, político e historiador português:
«Agora à tarde as cápsulas das granadas começaram a tanger lugubremente a gás alarme. Daí a pouco não se via senão gente sufocando, tossindo, com o nariz e a guela queimada e os olhos irritados lagrimejando. - Ponham as máscaras! Ponham as máscaras – grita-se.E breve vê-se rodar a multidão dos fantasmas mascarados com os grandes óculos pávidos e a tromba horrível e anelada, caindo do fole que tapa a cara. O Fraústo, um dos alferes artilheiros, vem em braços da bateria, tossindo, chorando, vomitando, rouco, aflito, Indignado, os olhos a saltar e uma baba espumosa, orlando-lhe a boca. - Morro! Sufoco! Malandros! Salve-me doutor! Acuda-me! Temos que o levar em braços para o posto. Prestam-se-lhe os primeiros socorros. Quero depois que ele ponha a máscara, mas ele não pôde, não quer. Continua a sufocar, a chorar, a babar-se, ansiando horrorosamente. Tiro a máscara e falo-lhe, encosto-o a mim, animo-o e convenço-o. Saímos agora. Parece que o vendaval dos gases amainou. Destapam-se as caras. Mas chegam sempre mais e mais homens que vomitam e choram e ansiam interminavelmente. » (Jaime Cortesão, Memórias da Grande Guerra 1914 – 1918), Porto: Renascença Portuguesa, 1919, p. 171).
Jaime Cortesão foi bem explícito. Não só Fraústo, o avô de Ana, foi gaseado durante a sua estadia nas trincheiras da Frente Ocidental. Toda uma geração de combatentes portugueses em França sofreria os efeitos dos gases, chegando a adoecer e, por vezes, nunca mais recuperando a saúde com que haviam partido para a guerra.
Era a guerra. Enquanto quintanista de Direito na Universidade de Coimbra, António terá sido mobilizado, embarcando para França a 19 de Janeiro de 1917 enquanto aspirante a oficial miliciano de Artilharia. Foi assim colocado no 5º Grupo de Batarias de Artilharia, pertença do Regimento de 1. Fez o curso de gás e foi promovido a alferes miliciano já em França.
Com o ataque de gás já mencionado, terá chegado a ser dado como desaparecido. Foi-lhe concedida licença para tratamento e, posteriormente a 9 de Abril de 1918, devido à reestruturação dos batalhões, foi integrado no 4º Grupo de Baterias de Artilharia, bem como incorporado num grupo britânico.
Regressaria a Lisboa em 8 de Fevereiro de 1919. Pouco depois tomaria parte das operações a Norte, efectuadas contra os revoltosos monárquicos que instauraram a denominada Monarquia do Norte. Em Abril de 1919 pede licença ilimitada para poder concluir o curso, o que não viria a concretizar-se.
Casou em Montalvão no dia 30 de Maio de 1921 com Amália Joaquina Pinto de Faria Pestana, nascida em 1902, e tiveram 5 filhos. Entre os seus herdeiros, conservam-se a máscara antigás, na sua bolsa identificada, fotografias tiradas em França, com dedicatórias, dois pequenos lenços bordados com as bandeiras dos países aliados, trazidos de França e oferecido à sua noiva, Amália, com quem casaria, e o seu copo, de metal.
Não falava muitas vezes da sua participação na guerra, mas quando a comentava, percebia-se que não apreciava grandemente os ingleses, embora lhes reconhecesse valor. Contava que sendo oficial, frequentava uma espécie de bar ou cantina onde era bem acolhido pelos oficiais ingleses, até porque falava a língua, excepto quando ia acompanhado de um português que fora seu colega na faculdade de Coimbra, e era mestiço.
Contava também que, estando uma vez de vigia numa estrutura elevada, desceu por uns instantes para recolher uma cerveja que um camarada lhe levara; nesse preciso momento, a torrezinha foi atingida por um morteiro. Salvou-se, pois, por um triz.
Todos os anos se reunia com outros homens da sua aldeia natal que tinham também combatido em França. Quando conseguia arranjá-la, partilhavam uma lata de corned beef, que lhes dava grande prazer, embora, no geral, dissessem que a comida não prestava. Ana Morão conheceu alguns destes homens. Um deles, conhecido por “Ti Alfredo”, tinha sido corneteiro e, com a voz, fazia os “toques” de corneta. Ti Alfredo afirmava ter sido o corneteiro que desfilou com o contingente português por baixo do Arco do Triunfo, em Paris, no dia da Vitória.
Quanto a António Joaquim Fraústo, viveu ainda para ver o seu filho mais novo, António partir para Moçambique, durante a guerra colonial. Infelizmente, não viria a assistir ao seu regresso, pois faleceu a 6 de Dezembro de 1972.
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