Trabalhar em tempo de guerra

Uma fábrica de munições em Arroios, Portugal, 1918. Uma fábrica de munições em Arroios, Portugal, 1918. Ilustração Portuguesa, II série, n.º 641, 3 de Junho de 1918, p. 431
 
Os efeitos da I Guerra Mundial foram sentidos também no mundo do trabalho. O conflito apresentou impactos vários não só no quotidiano dos trabalhadores - principalmente no que diz respeito aos efeitos da escassez de alimentos, sem esquecer o recrutamento militar -, mas também de forma indirecta, incidindo sobre a mobilização dos sectores produtivos para as necessidades do momento.
 
Numa época de carência de alimentos, açambarcamento, mercado negro e aumento de preços, com a consequente diminuição dos salários reais, os conflitos sociais intensificaram-se, tendo lugar uma sucessão de greves e assaltos a armazéns, que atingiram uma maior incidência em 1917, quando, por exemplo, tem lugar uma campanha contra a carestia de vida organizada pela União Operária Nacional.
 
Mas, paralelamente surge, nesta época, uma abundante legislação que abarcava as questões do trabalho, principalmente a nível industrial. Logo a 22 de Janeiro de 1915, surgiam as leis n.ºs 295 e 296 que fixavam o número de horas de trabalho diário para cada sector, estabelecendo ainda as regras para o trabalho extraordinário, nocturno ou em condições insalubres ou perigosas.
 
De facto, as dificuldades provocadas pelo deflagrar da guerra levaram à percepção por parte do Estado da necessidade de proteger os sectores produtivos considerados indispensáveis ao esforço de guerra, como a indústria química e os adubos. Assim se compreende a lei da mobilização das indústrias particulares necessárias ao esforço de guerra, sempre que as estatais não fossem consideradas suficientes. Mas não só as indústrias seriam mobilizadas. A 24 de Maio de 1916, poucos meses após a declaração de guerra, seria promulgado o decreto que regulamentava o recrutamento militar de todos os cidadãos com idades compreendidas entre os vinte e os quarenta e cinco anos, bastante criticado pelos industriais pelo facto de comprometer a economia nacional, retirando aos sectores produtivos a mão-de-obra necessária à sua manutenção. Apesar de tudo, as características do sector fizeram com que a carência de mão-de-obra não se tivesse tornado numa questão tão premente como noutros contextos nacionais, como o britânico ou o francês.
 
Mas trabalhar em tempo de guerra passou também, para alguns trabalhadores, pela saída do País, abrindo-se novas oportunidades para a emigração principalmente para países beligerantes, onde se esperava poder colocar mão-de-obra que substituísse os trabalhadores recrutados ou os estrangeiros expulsos. Esta vaga tinha como destino países como Inglaterra, Marrocos, Espanha e, sobretudo, França que, em 1915, passa a requisitar contingentes de mão-de-obra estrangeira para as fábricas de munições, colmatando as falhas causadas pelo recrutamento militar, o que conduziu à saída de cerca de 16 000 portugueses em direcção àquele País.
 
Por último, é importante referir que a análise histórica da época permite-nos, actualmente, entender que os trabalhadores, principalmente o operário especializado industrial, mas também o agrícola, apresentaram-se na conjuntura da guerra como agentes indispensáveis para a manutenção dos sectores produtivos dos países envolvidos no conflito e para o atingir dos objectivos que os desafios do tempo lançavam.
 
Ana Carina Azevedo (IHC)
 
Cite como: Ana Carina Azevedo, "Trabalhar em tempo de Guerra", A Guerra de 1914 - 1918, www.portugal1914.org

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