Tomás Wylie Fernandes nasce em Lisboa em 1883. O seu percurso está já inclusivamente registado na obra «Portugal na grande guerra: "guerristas e antiguerristas": estudos e documentos», de 1988, de João Medina.
Para lá das funções que desempenhou durante a Primeira Guerra foi, durante a Primeira República, Ministro das Colónias, “num dos governos de pouca duração”, em 1921.Viria posteriormente a ser nomeado representante de Portugal na comissão de reparações de guerra alemãs, pelo que esteve até 1934 em Paris. Depois, já com o Estado Novo, e sendo que se considerou que já não havia razão de ser da sua presença em Paris, que o novo regime alemão rendera inútil, regressou a Lisboa, onde Oliveira Salazar lhe dá funções no Ministério dos Negócios Estrangeiros, sendo nomeado Consultor Económico, (cessando de ser militar), funções que desempenha até se reformar.
Na primeira guerra
Ao relatar a história do avô, Manuel Tomás Fernandes Pereira fala com orgulho das razões que podem explicar a presença do avô nas importantes missões que lhe foram confiadas. Filho de mãe escocesa, o capitão era bilingue, facto que se revelaria útil e lhe conferiria uma maior proximidade daqueles que trabalharam para a concretização da entrada de Portugal no conflito e da criação do C.E.P. Além disso, ele tinha sido já adjunto de Norton de Matos quando este foi Governador de Angola e granjeara a sua confiança e amizade. Razão pela qual, se pensa, que este o terá chamado para estar nas negociações que levaram Portugal à participação no conflito.
Em finais de 1916, foi nomeado Adido Militar Adjunto em Paris, onde teve como grande amigo o futuro embaixador João Chagas que nas suas memórias se refere, por diversas vezes, ao capitão com muita simpatia (o neto ressalta que nem era muito frequente nestes escritos de Chagas, pois este escreveu coisas muito criticas relativamente à época que viveu e às figuras da República).
Em finais de 1917 é transferido para Londres, onde também foi Adido Militar Adjunto. Foi igualmente secretário da delegação portuguesa enviada à Conferência de Versalhes, que ali ocorreu para que se pudessem discutir os assuntos e as questões do pós-guerra.
Questionado relativamente à mobilização do seu avô, o Dr. Manuel Tomás responde que, na realidade, a ordem de mobilização “não terá colocado o avô no terreno, num campo, com tropas e a chefiar homens”, mas a contactar directamente com Norton de Matos, e a envolver-se nas negociações com a Missão Inglesa e a Missão Francesa que vieram a Portugal, particularmente com a primeira. Alias, citando a biografia de João Medina, refere que o seu avô chegaria a conseguir para Portugal um acordo mais favorável com os ingleses, aspecto que ele próprio desconhecia, “quando se é novo não se fazem as perguntas necessárias, e por vezes, quando queremos saber é tarde demais”.
Para além de memórias, Manuel Tomás Fernandes Pereira herdou do avô alguns objectos e recordações materiais, relativos à sua vivência e participação na primeira guerra mundial e que trouxe aos dias da memória:
Como nos conta, trouxe fotografias e um tinteiro que foi oferecido ao avô, em 1916, pela Missão Militar Inglesa, então em Portugal. E trouxe também, as credenciais e o mapa da sala da Cerimónia de Assinatura do Tratado de Paz, em Versalhes, em 1919, já depois do fim da guerra, entre outros elementos do seu espólio pessoal.
Primeiramente o tradicional retrato do soldado, Tomás Wylie Fernandes, à época em que se encontrava em Paris, onde esteve como capitão de artilharia e adido militar.
Outra, relacionada com a Missão Militar Inglesa, que veio a Portugal, uma grande fotografia, emoldurada e assinada, pelos seus elementos, tirada em Londres onde Norton de Matos fora ultimar a participação do CEP no conflito. Nela encontra-se Norton de Matos, o General Barnardiston, Tomás Wylie Fernandes, o General Roberto Baptista, Chefe do Estado-Maior do CEP, vários ingleses, e um outro elemento, um português, que o familiar desconhece. Estão patentes as assinaturas dos elementos fotografados e uma referência ao local e data: Londres, 12 de Junho de 1917
O papel importante de Tomás Wylie Fernandes nesta delegação faz com que os seus membros lhe ofereçam o tinteiro, por reconhecimento pelo seu trabalho. Este tem inscrições de três dos membros que estão na fotografia já referida.
Deste magnifico espólio conta ainda a cópia de um texto de João de Barros em homenagem aos soldados que partiam para a guerra que fez parte de uma sessão ocorrida no Coliseu com esse intuito e que o capitão fez questão de guardar.
Da sua presença na Conferência da Paz chegaram-nos documentos relativos à cerimónia de assinatura do Armistício e à própria Conferência da Paz, que nos são trazidos pelo Dr. Manuel Tomás. Destaca-se um original da capa de uma das cópias do tratado assinado por Loyd George e por Clemenceau, verdadeiramente emocionante de se ver e tocar. Também as credenciais de entrada no Palácio de Versalhes atribuídas ao capitão Tomás Wylie Fernandes e o plano da sala onde se assinou a Paz estavam entre os documentos trazidos pelo seu neto, para além da fotografia tirada durante a Conferência da Paz, com Afonso Costa, João Chagas, João Bianchi, futuro embaixador em Washington, para além do próprio capitão.
Para lá dos objectos que trouxe aos dias da Memória, o Dr. Manuel Tomás procurou completar as memórias do seu avô com muitas histórias e memórias da sua mãe (filha do capitão), que esteve em Paris e em Londres e lá viveu os anos da guerra apesar de muito pequena, pois nasceu em 1911.
Da mãe ouviu o que era sentir uma cidade bombardeada, muitos dos bombardeamentos de Londres foram por ela presenciados. Referia ela que tinha de dormir vestida, para poder ser levada, de forma rápida, pela mãe para a cave de cada vez que havia um alerta. E pôde ainda ouvir dela o delírio do dia do Armistício, em que na escola as professoras diziam que, se às 11 horas da manhã ouvissem os sinos a tocar, podiam atirar tudo pela janela. E que no caminho para casa as pessoas se abraçavam e se beijavam nas ruas, dizendo “The War is Over”. São memórias que ainda hoje, recordando as conversas com mãe, o emocionam muito.
Um dos aspectos que considera talvez o mais interessante está relacionado a João Chagas, é a colecção de postais da Primeira Guerra Mundial, que o Dr. Manuel Tomás levou à AR, e que foi quase inteiramente feita pelo próprio embaixador português, tendo sido depois entregue pela viúva de Chagas à sua mãe. Esta regressou de Paris muito pequena, com apenas 5 anos, e era uma espécie de «neta-honorária» do casal Chaves, que não tinha filhos. As famílias ficaram muito amigas e, embora João Chagas viesse a falecer em 1925, a viúva tratava realmente a mãe do Dr. Manuel Tomás como neta.
Por essa razão, entre outras coisas, ofereceu-lhe a colecção de postais feita por Chagas, à qual foram depois adicionados postais pelo próprio Tomás Wylie Fernandes e alguns pelo pai do Dr. Manuel Tomás, já mais modernos e também uma fotografia de João Chagas, com uma dedicatória para a sua mãe.
Esta impressionante colecção destaca-se, tanto pela dimensão e estado de conservação, como também pelos intervenientes na sua compilação. É uma colecção verdadeiramente única!
Reconstituindo a história do avô, o que o neto considera extraordinário é a forma como o avô sobreviveu “aos golpes e a todos os problemas daquela época, e continuou sempre a trabalhar”, acredita que a explicação pode residir no facto dele ser um homem honesto, trabalhador, tendo a grande vantagem de ser bilingue, dominando o inglês e o português, o que se terá tornado muito útil, mas tinha também o conhecimento das relações entre Portugal a Grã-Bretanha e França nesta fase da guerra e conhecia algumas pessoas mais destacadas da época, nomeadamente Norton de Matos, Afonso Costa, entre outros.
Uma vitalidade notável de uma pessoa não menos notável, que fez parte de um dos episódios mais marcantes da história contemporânea portuguesa.
Para lá das funções que desempenhou durante a Primeira Guerra foi, durante a Primeira República, Ministro das Colónias, “num dos governos de pouca duração”, em 1921.Viria posteriormente a ser nomeado representante de Portugal na comissão de reparações de guerra alemãs, pelo que esteve até 1934 em Paris. Depois, já com o Estado Novo, e sendo que se considerou que já não havia razão de ser da sua presença em Paris, que o novo regime alemão rendera inútil, regressou a Lisboa, onde Oliveira Salazar lhe dá funções no Ministério dos Negócios Estrangeiros, sendo nomeado Consultor Económico, (cessando de ser militar), funções que desempenha até se reformar.
Na primeira guerra
Ao relatar a história do avô, Manuel Tomás Fernandes Pereira fala com orgulho das razões que podem explicar a presença do avô nas importantes missões que lhe foram confiadas. Filho de mãe escocesa, o capitão era bilingue, facto que se revelaria útil e lhe conferiria uma maior proximidade daqueles que trabalharam para a concretização da entrada de Portugal no conflito e da criação do C.E.P. Além disso, ele tinha sido já adjunto de Norton de Matos quando este foi Governador de Angola e granjeara a sua confiança e amizade. Razão pela qual, se pensa, que este o terá chamado para estar nas negociações que levaram Portugal à participação no conflito.
Em finais de 1916, foi nomeado Adido Militar Adjunto em Paris, onde teve como grande amigo o futuro embaixador João Chagas que nas suas memórias se refere, por diversas vezes, ao capitão com muita simpatia (o neto ressalta que nem era muito frequente nestes escritos de Chagas, pois este escreveu coisas muito criticas relativamente à época que viveu e às figuras da República).
Em finais de 1917 é transferido para Londres, onde também foi Adido Militar Adjunto. Foi igualmente secretário da delegação portuguesa enviada à Conferência de Versalhes, que ali ocorreu para que se pudessem discutir os assuntos e as questões do pós-guerra.
Questionado relativamente à mobilização do seu avô, o Dr. Manuel Tomás responde que, na realidade, a ordem de mobilização “não terá colocado o avô no terreno, num campo, com tropas e a chefiar homens”, mas a contactar directamente com Norton de Matos, e a envolver-se nas negociações com a Missão Inglesa e a Missão Francesa que vieram a Portugal, particularmente com a primeira. Alias, citando a biografia de João Medina, refere que o seu avô chegaria a conseguir para Portugal um acordo mais favorável com os ingleses, aspecto que ele próprio desconhecia, “quando se é novo não se fazem as perguntas necessárias, e por vezes, quando queremos saber é tarde demais”.
Para além de memórias, Manuel Tomás Fernandes Pereira herdou do avô alguns objectos e recordações materiais, relativos à sua vivência e participação na primeira guerra mundial e que trouxe aos dias da memória:
Como nos conta, trouxe fotografias e um tinteiro que foi oferecido ao avô, em 1916, pela Missão Militar Inglesa, então em Portugal. E trouxe também, as credenciais e o mapa da sala da Cerimónia de Assinatura do Tratado de Paz, em Versalhes, em 1919, já depois do fim da guerra, entre outros elementos do seu espólio pessoal.
Primeiramente o tradicional retrato do soldado, Tomás Wylie Fernandes, à época em que se encontrava em Paris, onde esteve como capitão de artilharia e adido militar.
Outra, relacionada com a Missão Militar Inglesa, que veio a Portugal, uma grande fotografia, emoldurada e assinada, pelos seus elementos, tirada em Londres onde Norton de Matos fora ultimar a participação do CEP no conflito. Nela encontra-se Norton de Matos, o General Barnardiston, Tomás Wylie Fernandes, o General Roberto Baptista, Chefe do Estado-Maior do CEP, vários ingleses, e um outro elemento, um português, que o familiar desconhece. Estão patentes as assinaturas dos elementos fotografados e uma referência ao local e data: Londres, 12 de Junho de 1917
O papel importante de Tomás Wylie Fernandes nesta delegação faz com que os seus membros lhe ofereçam o tinteiro, por reconhecimento pelo seu trabalho. Este tem inscrições de três dos membros que estão na fotografia já referida.
Deste magnifico espólio conta ainda a cópia de um texto de João de Barros em homenagem aos soldados que partiam para a guerra que fez parte de uma sessão ocorrida no Coliseu com esse intuito e que o capitão fez questão de guardar.
Da sua presença na Conferência da Paz chegaram-nos documentos relativos à cerimónia de assinatura do Armistício e à própria Conferência da Paz, que nos são trazidos pelo Dr. Manuel Tomás. Destaca-se um original da capa de uma das cópias do tratado assinado por Loyd George e por Clemenceau, verdadeiramente emocionante de se ver e tocar. Também as credenciais de entrada no Palácio de Versalhes atribuídas ao capitão Tomás Wylie Fernandes e o plano da sala onde se assinou a Paz estavam entre os documentos trazidos pelo seu neto, para além da fotografia tirada durante a Conferência da Paz, com Afonso Costa, João Chagas, João Bianchi, futuro embaixador em Washington, para além do próprio capitão.
Para lá dos objectos que trouxe aos dias da Memória, o Dr. Manuel Tomás procurou completar as memórias do seu avô com muitas histórias e memórias da sua mãe (filha do capitão), que esteve em Paris e em Londres e lá viveu os anos da guerra apesar de muito pequena, pois nasceu em 1911.
Da mãe ouviu o que era sentir uma cidade bombardeada, muitos dos bombardeamentos de Londres foram por ela presenciados. Referia ela que tinha de dormir vestida, para poder ser levada, de forma rápida, pela mãe para a cave de cada vez que havia um alerta. E pôde ainda ouvir dela o delírio do dia do Armistício, em que na escola as professoras diziam que, se às 11 horas da manhã ouvissem os sinos a tocar, podiam atirar tudo pela janela. E que no caminho para casa as pessoas se abraçavam e se beijavam nas ruas, dizendo “The War is Over”. São memórias que ainda hoje, recordando as conversas com mãe, o emocionam muito.
Um dos aspectos que considera talvez o mais interessante está relacionado a João Chagas, é a colecção de postais da Primeira Guerra Mundial, que o Dr. Manuel Tomás levou à AR, e que foi quase inteiramente feita pelo próprio embaixador português, tendo sido depois entregue pela viúva de Chagas à sua mãe. Esta regressou de Paris muito pequena, com apenas 5 anos, e era uma espécie de «neta-honorária» do casal Chaves, que não tinha filhos. As famílias ficaram muito amigas e, embora João Chagas viesse a falecer em 1925, a viúva tratava realmente a mãe do Dr. Manuel Tomás como neta.
Por essa razão, entre outras coisas, ofereceu-lhe a colecção de postais feita por Chagas, à qual foram depois adicionados postais pelo próprio Tomás Wylie Fernandes e alguns pelo pai do Dr. Manuel Tomás, já mais modernos e também uma fotografia de João Chagas, com uma dedicatória para a sua mãe.
Esta impressionante colecção destaca-se, tanto pela dimensão e estado de conservação, como também pelos intervenientes na sua compilação. É uma colecção verdadeiramente única!
Reconstituindo a história do avô, o que o neto considera extraordinário é a forma como o avô sobreviveu “aos golpes e a todos os problemas daquela época, e continuou sempre a trabalhar”, acredita que a explicação pode residir no facto dele ser um homem honesto, trabalhador, tendo a grande vantagem de ser bilingue, dominando o inglês e o português, o que se terá tornado muito útil, mas tinha também o conhecimento das relações entre Portugal a Grã-Bretanha e França nesta fase da guerra e conhecia algumas pessoas mais destacadas da época, nomeadamente Norton de Matos, Afonso Costa, entre outros.
Uma vitalidade notável de uma pessoa não menos notável, que fez parte de um dos episódios mais marcantes da história contemporânea portuguesa.
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